A ligação entre o Sport Lisboa e Benfica e o 25 de Abril de 1974 é profundamente simbólica. Ao longo do Estado Novo, o Benfica foi muitas vezes apontado — erradamente — como o “clube do regime”. A verdade, sustentada por documentos e testemunhos históricos, mostra o oposto: o Benfica foi um clube que viveu sob vigilância, foi condicionado, e resistiu silenciosamente à máquina de propaganda salazarista.
⚠️ Mito vs Realidade: O Benfica não foi o clube do regime
Apesar da narrativa popular, Salazar nunca foi benfiquista. Era adepto da Académica de Coimbra, e a sua ligação ao futebol era mais estratégica do que passional.
✅ Exemplo real:
- O Sporting beneficiava de apoios estruturais e institucionais. Muitos dos seus dirigentes e treinadores eram próximos da Mocidade Portuguesa e da Legião Portuguesa.
- Em contrapartida, o Benfica, com raízes operárias e populares, era visto com mais receio pelas autoridades — por ser difícil de controlar.
🛑 Como o Benfica foi prejudicado pelo regime
1. PIDE infiltrada no clube
Vários sócios e dirigentes benfiquistas, entre eles o ex-jogador e treinador Rogério Pipi, foram vigiados pela PIDE, por posições críticas ao regime ou ligações a movimentos de oposição.
Havia medo de que o estádio servisse de “palco” para manifestações encobertas.
2. Censura na imprensa
Mesmo quando ganhava títulos europeus, como em 1961 e 1962 com Eusébio e Coluna, a imprensa oficial atribuía o sucesso ao "espírito nacional" e não ao mérito do clube.
Em jornais como o Diário da Manhã, controlado pelo regime, as vitórias do Benfica eram despolitizadas e pouco exploradas.
3. Viagens bloqueadas ou controladas
Durante a presidência de Maurício Vieira de Brito, o Benfica enfrentou restrições burocráticas para viajar para jogos europeus, e as deslocações tinham de ser comunicadas à Direção-Geral de Segurança.
4. Pressão nas eleições internas
Algumas eleições no clube foram objeto de suspeitas de intromissão política, com o regime a favorecer candidatos mais “conservadores” e “não conflituosos”.
🎵 O hino censurado: “Avante, Avante p'lo Benfica”
O hino original do Sport Lisboa e Benfica, intitulado “Avante, Avante p'lo Benfica”, foi composto em 1929 por Félix Bermudes (letra) e Alves Coelho (música), por ocasião do 25.º aniversário do clube. A canção exaltava os valores de união, esforço e glória, refletindo o espírito combativo e popular do Benfica.
Durante o regime do Estado Novo, o hino foi alvo de censura. A palavra “Avante”, presente no título e no refrão, era associada ao jornal “Avante!”, órgão oficial do Partido Comunista Português, o que levou o regime a considerá-la subversiva. Consequentemente, em 1942, o hino foi proibido de ser executado publicamente.
Em resposta à censura, o Benfica adotou, em 1953, a canção “Ser Benfiquista”, escrita por Manuel Paulino Gomes Júnior e interpretada por Luís Piçarra, como hino alternativo. Esta nova composição, embora não oficializada como hino do clube, passou a ser utilizada em eventos e jogos, substituindo o original censurado.
Após a Revolução de 25 de Abril de 1974, que pôs fim ao regime ditatorial, o hino “Avante, Avante p'lo Benfica” voltou a ser reconhecido e valorizado pelos adeptos, simbolizando a resistência e a identidade democrática do clube.
📅 25 de Abril: O Benfica liberta-se
A manhã do 25 de Abril de 1974 foi recebida com alívio no Estádio da Luz. Vários jogadores e antigos dirigentes, incluindo Álvaro Magalhães e Humberto Coelho, mais tarde revelaram que muitos elementos do clube simpatizavam com os ideais democráticos, mas tinham medo de represálias.
Com a queda do regime:
- A censura nos media desapareceu
- As eleições internas tornaram-se mais transparentes
- O Benfica passou a ser mais internacional, sem barreiras políticas
❤️ O Benfica e os valores de Abril
Desde então, o Benfica nunca deixou de mostrar o seu compromisso com a liberdade, igualdade e mérito. Em várias ocasiões, o clube fez questão de se associar às celebrações do 25 de Abril, com:
- Minutos de silêncio e faixas em jogos
- Exposições no Museu Cosme Damião
- Parcerias com instituições de memória histórica